A DESINFORMAÇÃO SOBRE O PLÁGIO NOS MEIOS ACADÊMICOS: as diferentes sanções administrativas que o repreendem e seus efeitos.
Gabriel Vicente Andrade
Acadêmico de Direito da UFPR, Pesquisador do Grupo de Pesquisa de Direito Autoral e Industrial -GEDAI/UFPR.
Marcos Wachowicz
Professor de Direito na Universidade Federal do Paraná – UFPR.
Doutor em Direito pela Universidade Federal do Paraná-UFPR.
Mestre em Direito pela Universidade Clássica de Lisboa – Portugal.
Professor da Cátedra de Propriedade Intelectual no Institute for Information, Telecommunication and Media Law – ITM da Universidade de Münster – ALEMANHA (2018).
Coordenador-lider do Grupo de Estudos em Direito Autoral e Industrial – GEDAI / UFPR vinculado ao CNPq.
INTRODUÇÃO
Historicamente, a palavra plágio tem origem grega, plagios – aquilo que é oblíquo, trapaceiro. Já no direito romano, o plagium consistia no crime de apropriação e venda de uma pessoa por parte de quem não a dispunha.
O plágio atualmente consiste na ação de uma pessoa de usurpar uma obra intelectual (ideias, escritos, conceitos, obras artísticas, dentre outras) atribuindo-se a autoria como se fosse sua a produção. O plágio no meio acadêmico sempre foi reprovado como conduta antiética, existindo uma tendência das instituições de ensino em se coibir tal prática, com base na legislação vigente.
No Brasil, o Código Civil de 1916 descrevia a conduta em seu artigo 524“A lei assegura ao proprietário o direito de usar, gozar e dispor de seus bens, e de reavê-los do poder de quem quer que injustamente os possua. Parágrafo único. A propriedade literária, científica e artística será regulada conforme as disposições do Capítulo VI deste Título.” (BRASIL, 2002). Assim, já se observava a proteção aos frutos do intelecto do autor.
Atualmente, o Código Penal brasileiro descreve o plagio como um crime contra a propriedade intelectual, assim como uma violação ao Direito Autoral, em seu art. 184. Os Direitos Autorais são aqueles que conferem ao autor de uma obra, direitos patrimoniais e morais sobre sua produção, garantindo a observância da sua autoria, a referência ao seu nome, quando sua produção for utilizada, e outros direitos subjetivos em relação a sua obra.
O jurista Carlos Bittar delimita o conceito com sapiência:
“As relações regidas por esse direito nascem com a criação da obra, exsurgindo, do próprio ato criador, direitos respeitantes à sua face pessoal (como direito de paternidade denominação de integridade da obra), e de outro lado, com sua comunicação ao público, os direitos patrimoniais (distribuídos por dois grupos de processos, a saber, os de representação e os de reprodução da obra, como, por exemplo, para músicas o direito de fixação gráfica de gravação de inserção em fita, de inserção em filme, de execução e outros).”(BITTAR,2005).
Neste sentido, a lei n° 9.610/1998, dispõe a respeito dos Direitos Autorais no Brasil, determinando sobre as obras protegidas, os registros de obras, os direitos do autor e seus limites, transferência de direitos, utilização de obras e direitos de intepretação.
Ademais, a Constituição Federal tutela os direitos do autor, por meio do Art. 5, XXVII “aos autores pertence o direito exclusivo de utilização, publicação ou reprodução de suas obras, transmissível aos herdeiros pelo tempo que a lei fixar” (BRASIL, 1988).
É notória a escassez de delimitação do crime por parte da atual legislação, sendo que a discussão se desenvolve sobre os direitos do autor, mas pouco se discute na legislação sobre a tipificação do plágio – o trabalho de delimitar melhor a discussão parte dos doutrinadores –, o que, por conseguinte dificulta a sua caracterização, assim como a imposição de sanções e a prevenção do crime.
O plágio, cujo meio de ocorrência é o acadêmico, denomina-se plagio acadêmico. Neste meio, o plágio acontece de maneira banalizada, tendo em vista a sorrateira disseminação de maneiras de plagiar, em oposição ao insólito esforço empregado pelas universidades, a fim de evitar a sua ocorrência. Sobre a ocorrência do plágio na academia, ensinam os professores Marcos Wachowicz e José Augusto F. Costa: “Falsificar monografias, teses, artigos, livros, trabalhos, provas ou outras tantas formas de expressão da pesquisa acadêmica parece ser o âmbito típico do plágio. Sobretudo em uma época na qual o contato com os novos meios de comunicação, armazenagem, análise e utilização de dados vem desafiando os meios mais tradicionais de produzir e divulgar conhecimento.” (COSTA E WACHOWICZ,2016).
A produção intelectual decorrente de plágio é vil, pouco acrescenta ao desenvolvimento científico e intelectual, como defende Marcelo Krokoscz: “Por caracterizar-se como prática desonesta, é incompatível com o escopo universitário de criação e desenvolvimento do conhecimento” (KROKOSCZ, 2015).
Sendo assim, propagação e a perpetuação do plágio no meio acadêmico são nocivas ao processo de produção intelectual e, portanto, sua identificação, através de ferramentas institucionais e sua prevenção, por meio de sanções administrativas, devem ser eficientes.
METODOLOGIA PARA COLETA DOS DADOS SOBRE O PLÁGIO ACADÊMICO
O presente estudo busca analisar o processo de identificação e punição do plágio, dentro do meio acadêmico, visando responder se o tratamento atual à questão é adequado. Para fim de realização desta análise, também serão utilizados os dados coletados pelo questionário on-line “plágio acadêmico”, enviado às principais universidades públicas do país.
Para a avaliação de algumas características do fenômeno do plágio nas universidades, foi utilizado o questionário plágio acadêmico, desenvolvido como um esforço do GEDAI para a atualização do livro “Plágio Acadêmico”, de autoria dos professores Marcos Wachowicz e José Augusto F. Costa. O questionário foi enviado no último trimestre de 2020, para as 14 melhores universidades públicas do país, segundo o ranking universitário da folha de são Paulo (RUF) de 2019. Foram elaborados três questionários, sendo que o utilizado no presente artigo fora o enviado às bibliotecas.
PLÁGIO: UMA CULTURA DE DESINFORMAÇÃO
O fenômeno do plágio envolve uma grande complexidade, pois é um assunto contencioso e, como já exposto, pouco delimitado e trabalhado pela legislação. Fato que corrobora tal complexidade é a insciência dos discentes sobre este tipo de crime, que chegam aos ambientes acadêmicos, muitas vezes, sem nem mesmo saber que existe algo como plágio.
Em pesquisa realizada no ano de 2018 (VEJA ABRIL, 2018), na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), 87% dos Estudantes alegaram não ter noção exata do que é plágio, o que demonstra que a desinformação a respeito do assunto é evidente entre a maior parte dos estudantes da Unicamp. Ademais, a pesquisa mostrou que somente 4.5% dos participantes acreditam que o plágio é sempre intencional, sendo que 36% dos entrevistados alegaram que concordam parcialmente com a afirmação “As pessoas cometem plágio porque não aprenderam corretamente as regras de citação”.
A partir da pesquisa, a Unicamp passou a elaborar maiores processos de disseminação de informação, aspirando prevenir o acontecimento do plágio, como por exemplo, ocorreu a divulgação do software Turnitin para detecção de plágio e o estabelecimento de sanções administrativas para punir tal comportamento.
O levantamento envolveu 958 alunos, portanto ocorreu em um ambiente restrito. Ainda assim a pesquisa revela a cultura da incompreensão integral do plágio em uma das maiores universidades do país, por consequência, é razoável projetar que em outros âmbitos acadêmicos, o processo de desconhecimento é similar. Neste sentido, discorre Caroline Koefender, em tese, sobre a importância da construção de um entendimento sobre o assunto, com o objetivo de diminuir a ocorrência da prática: “Diante da análise do problema proposto para este estudo – o crime de plágio em trabalhos acadêmicos de conclusão -, pode-se concluir que se necessita criar uma cultura de ética acadêmica, na qual efetuar referências e citações corretas das obras nos trabalhos acadêmicos seja rotina diária.” (KOEFENDER, 2018).
Tudo indica que a educação sobre o assunto pode ser o maior instrumento de combate ao plágio, conceituar o plágio, ensinar suas consequências e modos de evitar aos alunos é um caminho para inibir tal prática, além de que valorar a importância da ética na produção acadêmica é um meio concreto de elevar a consciência dos discentes. Ainda assim, existira o comportamento anômalo, sendo indispensável aperfeiçoar os métodos de identificação e a imposição de sanções repreensivas ao plágio.
O PROCESSO DE IDENTIFICAÇÃO DO PLÁGIO
A identificação do plágio é um processo, normalmente, de colaboração, pois em trabalhos acadêmicos, primeiramente o autor deve fazer o trabalho de fiscalização, evitando fazer citações sem referências e se adequando às normas da ABNT, em seguida o receptor deste trabalho necessita fazer a fiscalização, buscando por fragmentos plagiados, o que ocorre, usualmente, por meio de aplicativos, cujas funcionalidades são variadas.
APLICATIVOS ANTI-PLÁGIO
No mercado de ferramentas de combate ao plágio existem uma série de aplicativos disponíveis. Através do questionário “Plágio Acadêmico”, enviado às bibliotecas das universidades, foi possível ter uma percepção do cenário de fiscalização do plágio nas universidades.
Cabe, usualmente, as bibliotecas das instituições, junto ao esforço das alas administrativas das faculdades, a conscientização e a inibição da prática do plágio. Portanto, em questionário enviado às bibliotecas, foi perguntado se há aplicativo de fiscalização indicado pela universidade. Como resposta, 55,6% das bibliotecas questionadas afirmaram que possuíam aplicativo recomendado, sendo que todas utilizavam do aplicativo Turnitin.
O Turnitin armazena uma base de produções científicas e a utiliza para comparar com os trabalhos publicados na universidade, assim notificando quando há a suspeita de plágio.
Ainda assim, cerca da metade das bibliotecas questionadas alegaram não haver um aplicativo de fiscalização indicado pela própria universidade, fato que suscita outro dado, a disseminação do combate ao plágio é muito frágil nas instituições, afirmação corroborada pelas respostas ao questionário, pois 50% das instituições alegam que, numa escala de 0 a 4, a efetividade de fiscalização do plágio estaria em 2, o meio termo.
AS SANÇÕES ADMINISTRATIVAS
Existem diversos tratamentos coercitivos em resposta ao plágio, através do questionário procurou visualizar-se qual o tipo de sanção é mais comum nas universidades. Ainda segundo as bibliotecas, a punição mais comum é a reescrita do trabalho.
Observa-se positivamente a reescrita do trabalho plagiado, pois parece o tipo de sanção que gera maior nível de entendimento sobre a dificuldade de se escrever um trabalho científico, somado ao conhecimento adquirido pela produção intelectual produzida.
Os desligamentos e as suspenções são tratamentos mais vigorosos que o reparo do trabalho, portanto aparecem em menor quantidade. Para a aplicação destas sanções deve-se analisar o contexto do plágio, sopesando fatores como a reincidência no plágio e quantidade de material plagiado, assim como o âmbito de atividade do acadêmico. É de se esperar que o plágio seja tratado com maior rigorosidade nos cursos pós-stricto sensu e nas atividades acadêmicas, pois ao alcançar tal nível de academicidade é desejável que o acadêmico tenha noção da deslealdade do plágio e suas consequências. Neste mesmo sentido aponta o questionário:
CONCLUSÃO
É perceptível que, apesar de costumeiro no meio acadêmico, o plágio ainda é pouco fiscalizado e inibido nas universidades e, por isso, há ainda a persistência da prática nestas instituições. Sendo assim, é necessário que as instituições se organizem de maneira mais efetiva a fim de se propagar um cultura anti-plágio, através de práticas institucionais, normativas mais especificas – quanto a determinação do plágio e as sanções consequente dele – e movimentos de conscientização a respeito do plágio.
A formação de um cenário de respeito aos direitos autorais no meio acadêmico, não só possibilita a produção acadêmica leal e saudável, como previne a prática criminosa do plágio e protege os direitos dos autores.
REFERÊNCIAS
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WACHOWICZ e COSTA. Plágio Acadêmico. Curitiba: Gedai Publicações/UFPR – 2016. disponível em: https://gedai.ufpr.br/wp-content/uploads/2018/08/plagio_academico_ebook.pdf. Acesso em: 16 de set. de 2020.
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