COVID-19: UMA ANÁLISE JURIMÉTRICA DO JUDICIÁRIO PARANAENSE

Fernando Schumak[i]

Isadora Almeida Calazans de T. Ribas[ii]

Magna Joelma Vaccarelli Knopik[iii]

Revisor: Marcos Wachowicz

A PANDEMIA DO COVID-19 E SEUS REFLEXOS NO MUNDO GLOBALIZADO

            A sociedade está vivenciando um momento histórico sem precedentes, no qual aliam-se a uma pandemia de um novo vírus os efeitos do mundo globalizado atual.

Há cem anos, um outro vírus da gripe assolou o globo, entre os anos de 1918 e 1920, a gripe espanhola. Com o término da I Guerra Mundial, o movimento de retorno das tropas militares aos seus países natais contribuiu para espalhar a gripe espanhola (H1N1) pelo mundo, infectando 40% da humanidade em dois anos.

Insta salientar que, somente após esses dois anos é que 40% da população mundial foi infectada pela gripe espanhola. E se acrescentarmos o fator da globalização à essa equação? Os resultados seriam ainda mais devastadores em termos sanitários, sociais e econômicos.

Hoje, na era da pós-modernidade, na sociedade digital do século XXI em que a humanidade se insere, o mundo está muito mais interligado do que no século passado. Nos dias atuais, com a facilitação de acesso físico e virtual às pessoas em outros países, onde milhares de voos intercontinentais são traçados todos os dias e, onde através de alguns cliques, pode-se conversar com alguém do outro lado do mundo,  a interação internacional atinge níveis nunca antes vistos.

Com a relativização das fronteiras físicas dos países, a globalização tomou forma através de uma intensificação econômica, social e política em todo globo.

Com essa modernização e transferência rápida de informações à nível mundial, houve também grandes avanços no desenvolvimento das novas tecnologias. Atualmente, diversos campos de pesquisa podem se valer da vantagem dos novos métodos científicos quantitativos para comprovar suas teses científicas com mais exatidão e clareza.

No âmbito das ciências jurídicas, pode-se utilizar método jurimétrico para trabalhar de forma mais empírica com os dados processuais. Jurimetria, de modo geral, se caracteriza como a estatística aplicada ao direito, na qual o Poder Judiciário se apresenta como a figura central, como um grande gerador de dados, os quais descrevem o funcionamento completo do sistema e das marcas que o direito ocasiona na sociedade[iv].

 

O IMPACTO DO COVID-19 NO JUDICIÁRIO PARANAENSE

Os dados aqui coletados e tratados, recortados entre março e maio de 2020, revelam aumento no número de casos, com ênfase à seara criminal, queda de produtividade dos magistrados, motivada pela suspensão dos prazos e período de adaptação ao teletrabalho, cumprindo o objetivo inicial do trabalho, via jurimetria, analisar o impacto da COVID-19 no Judiciário Paranaense, no recorte temporal estabelecido.

No cenário atual, os impactos do COVID-19 no Judiciário podem ser monitorados quase que em tempo real, a partir dos bancos de dados disponibilizados pelos tribunais brasileiros. De fato, só será possível a visualização completa do impacto da COVID-19 no Judiciário em 2021. Mas, é possível dar com exatidão o panorama atual e prever com certa correção o cenário imediatamente futuro.

Em épocas anteriores, seria impossível trabalhos como este, pois baseado em dados secundários de coleta quase que em tempo real.

 

A JUSMETRIA COMO MÉTODO DE ANALISE DOS DADOS PROCESSUAIS

A pergunta central do presente trabalho é se é possível, via jurimetria, demonstrar o impacto da pandemia do COVID-19 no Poder Judiciário paranaense, dentro do recorte temporal dos meses de março a maio de 2020. Dessa forma, nos propusemos a descrever o cenário contemporâneo de pandemia, assim como conceituar o método jurimétrico, aplicando-o na análise dos dados processuais fornecidos pelo Tribunal de Justiça do Paraná.

O objetivo geral do presente artigo é analisar via jurimetria, o impacto da COVID-19 no Judiciário paranaense, no recorte temporal estabelecido de março à maio de 2020 dos dados processuais disponibilizados pelo Tribunal de Justiça do Paraná.

Como objetivos específicos, o presente trabalho se propôs a contextualizar o cenário atual da COVID-19, conceituar pandemia e jurimetria, apresentar os dados recolhidos no TJPR através do método jurimétrico (entre março e maio de 2020), demonstrando ao final o impacto da pandemia no Judiciário paranaense nos dias atuais.

O método de trabalho utilizado foi uma análise quantitativa e qualitativa dos dados do Tribunal de Justiça do Paraná e da Secretaria de Estado e Saúde do Paraná, juntamente com análise bibliográfica e doutrinária.

Já a metodologia de pesquisa empregada neste trabalho foi o método jurimétrico, com a análise de dados disponibilizados no site do Tribunal e na página da Secretaria de Estado e Saúde do Paraná, assim como o método hipotético-dedutivo.

Em outras palavras, o presente trabalho não é volumétrico[v], pois que apresenta não apenas um compêndio de dados sem distinção analítica específica. Trabalhos como este, permitem ainda a comparação do impacto provocado pela pandemia nos diferentes tribunais brasileiros, possibilitando entre outras coisas o compartilhamento de informações a fim de melhor planejar o tratamento de crises futuras.

Deste mesmo modo, o presente trabalho se justifica pela contribuição a uma futura agenda de pesquisa com resultados empiricamente verificáveis.

Estudos semelhantes vêm sendo feitos no sentido de fornecer esclarecimentos teóricos necessários sobre Jurimetria e pandemia, o que reflete a relevância e a atualidade do tema em comento.

Na conjuntura internacional, a União Europeia através do CEPEJ (Comitê da comunidade em prol do desenvolvimento e eficiência da justiça) disponibiliza dados atualizados constantemente acerca do impacto do COVID-19 no âmbito jurídico.[vi] Do mesmo modo, os Estados Unidos da América e o Reino Unido estão realizando estudos sobre a eficiência judicial no atual cenário de pandemia.[vii]

Os dados e análise aqui apresentados poderão auxiliar os operadores do direito a prever um possível aumento da litigância e planejar suas decisões enquanto magistrados, servidores, advogados e partes.

Desta forma, o presente artigo propõe-se a analisar o impacto provocado pela pandemia do COVID-19 no Poder Judiciário brasileiro, mais especificamente no Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR), através do método jurimétrico.

 

A PANDEMIA COVID-19 NO CENÁRIO CONTEMPORÂNEO E A RELATIVIZAÇÃO DAS FRONTEIRAS

Distintamente da gripe espanhola, outra pandemia do vírus influenza ocorrida entre 1918 a 1920 que vitimou um quarto da população mundial, a qual teve sua disseminação aumentada com o retorno das tropas militares da I Guerra Mundial aos seus países natais, a atual pandemia do COVID-19 encontrou um cenário completamente diferente, muito mais propício para o alastramento da doença.

No cenário contemporâneo, com a relativização das fronteiras físicas dos países e com a rápida transferência de informações e pessoas no mundo globalizado, o vírus encontrou um cenário muito mais propício para a sua propagação em todos os continentes.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) decretou em 30 de janeiro de 2020 o surto de Coronavírus como uma Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional.

            Em 11 de março de 2020, a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou a Pandemia de COVID-19, doença causada pelo novo coronavírus, chamado de Sars-Cov-2. Essa declaração causou profundas mudanças no cotidiano da vida em sociedade em todo o mundo, fazendo com que os chefes de Estado em todos os continentes tivessem que tomar medidas sanitárias drásticas para conter a propagação do vírus.

De janeiro a maio de 2020, já foram 5 milhões de casos registrados do novo coronavírus, tendo o cenário global mudado acentuadamente desde os primeiros registros, na China, até o patamar atual, em que EUA, Rússia e Brasil lideram o número de infectados no mundo.

Diferentemente de surto, endemia e epidemia, a pandemia é caracterizada pela OMS como uma epidemia que se espalha rapidamente por todos os continentes do globo, pois a disseminação da doença atinge um nível global, cruzando as fronteiras internacionais, sendo o caso de maior gravidade.

No Brasil, em 03 de fevereiro de 2020, declarou-se o Coronavírus como Emergência de Saúde Pública de Importância Nacional, pela Portaria nº 188/2020 do Ministério da Saúde[viii], até então comandado pelo médico Luiz Henrique Mandetta. Nesta portaria, considera-se que o evento é complexo e demanda um esforço conjunto do Sistema Único de saúde, para a identificação e combate do vírus.

Posteriormente, o governo brasileiro emitiu a Portaria nº 365/2020, na qual promovem-se as medidas de isolamento social, necessárias para evitar e retardar a disseminação do COVID-19 no território nacional.

Em decorrência dessas medidas de contenção da pandemia no Brasil, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aprovou em 19 de março a Resolução nº 313, a qual determinou a suspensão dos prazos processuais em todos os setores do Poder Judiciário nacional até o dia 30 de abril de 2020 (exceto para o STF e a Justiça Eleitoral).

Em virtude dessas providências, as quais foram necessárias para contenção do COVID-19 no território nacional, o andamento processual das ações no Judiciário brasileiro foi afetado, inclusive na seara do Tribunal de Justiça do Paraná.

Dessa forma, em virtude dos impactos da pandemia no Brasil, propõe-se neste artigo a análise quantitativa e qualitativa (jurimétrica) do impacto no Judiciário nacional, mais estritamente no Tribunal de Justiça do Paraná.

 

A JURIMETRIA ENQUANTO CIÊNCIA DA ESTATÍSTICA APLICADA AO DIREITO

Ao longo dos séculos, métodos científicos quantitativos vêm sendo utilizados nos mais vastos campos de estudo, como na economia, na biologia, na física e na química, por exemplo.

Esses métodos surgiram com a necessidade de registrar e quantificar dados palatáveis, a fim de aferir de forma objetiva os resultados obtidos, confirmando ou refutando teorias científicas.

E da mesma forma, mesmo não sendo usual, o direito não ficaria de fora.[ix]

A pesquisa empírica legal, deveria ser, como em outras pesquisa empíricas, de longo prazo e poderia ajudar a estabelecer políticas públicas (Baldwin, J. & Davis, G. 2005;Engel, 2017). A situação mundial atípica, de pandemia, por exemplo, poderá ter seus estudos utilizados para outras situações similares de forma preditiva.

À priori, se faz necessária a caracterização do conceito de Jurimetria no presente trabalho científico. Em um contexto inicial, Jurimetria pode ser compreendida como a ciência da estatística aplicada ao direito, na qual o Poder Judiciário se apresenta como a figura central, como um grande gerador de dados, os quais descrevem o funcionamento completo do sistema e das marcas que o direito deixa na sociedade.[x]

A Associação Brasileira de Jurimetria deixa claro que, mesmo que os seus estudos se baseiem quase que exclusivamente em metodologias estatísticas, existem diversas outras abordagens jurimétricas além da teoria estatística formal. O que é tido como uma máxima em todas as análises jurímétricas são os princípios da concretude e da transparência na manipulação de dados judiciários.[xi]

A clareza e o cuidado na manipulação dos dados estatísticos é de suma importância para caracterizar uma boa Jurimetria, tendo em vista que esses dados dizem respeito a processos judiciais, aos magistrados, a decisões, aos Tribunais, e partes envolvidas.

Insta salientar que a Associação Brasileira de Jurimetria (ABJ) foi criada em 2011, sendo uma instituição sem fins lucrativos que tem como missão principal o incentivo do estudo empírico do Direito no país, com a utilização da Jurimetria como ferramenta que auxilia no aperfeiçoamento da prestação jurisdicional brasileira.[xii]

Em que pese não seja um conceito novo, (Lee Loevinger[xiii] falou pela primeira vez em Jurimetria em 1948) a sua utilização depende de dados, e o Judiciário Brasileiro era de fato uma “caixa preta” até a Emenda Constitucional 45/2004,[xiv] que, com a criação do CNJ, possibilitou a realização de extenso e denso trabalho volumétrico publicado anualmente no caderno Justiça em Números[xv], o qual é uma excelente fonte de dados para pesquisas empíricas.

Portanto, a Jurimetria é ferramenta efetiva no embasamento metodológico e na criação de processos estruturados, o que torna a análise dos dados padronizada e sequencial e, por consequência, mais factível. A aplicação de método de análise jurimétrica nas bases de dados disponíveis permite a tradução dessa massa de dados, que nos leva ao encontro da previsibilidade das decisões judiciais, com mais clareza e objetividade. Baseada no direito fundamental do livre acesso à informação pública, a Jurimetria torna-se um componente chave contemporâneo na criação de uma sociedade mais transparente, justa, assertiva e comprometida com o futuro.

Desta forma, no presente artigo propõe-se a análise e comparação do impacto provocado pela pandemia do COVID-19 no Poder Judiciário, mais especificamente no Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR), através do método jurimétrico.

 

OS DADOS DA PANDEMIA NO PODER JUDICIÁRIO PARANAENSE

Os dados sobre a produtividade dos tribunais são públicos e estão à disposição de todos. Basta acessar a página do TJPR, por exemplo, e ter acesso ao gráfico abaixo.

Fonte: Página do Tribunal de Justiça do Paraná, 2020

Porém, essa informação é ampla e não demonstra  a natureza específica dos atos praticados durante o teletrabalho. O artigo em comento contribui detalhando e depurando dados gerais a fim de identificar um cenário específico, qual seja: o impacto da COVID-19 sobre as decisões do TJPR.

Uma das medidas que o TJPR adotou no combate à pandemia baseia-se na Resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) nº 62 de 17 de março de 2020, que contém recomendações específicas aos Tribunais e seus funcionários (magistrados, técnicos, analistas, etc), para adoção de medidas preventivas à propagação da infecção pelo novo coronavírus – COVID-19, no âmbito dos estabelecimentos do sistema prisional e do sistema socioeducativo.

No combate à pandemia, o Estado do Paraná editou algumas normas no sentido de retardar a disseminação, dentre as quais se incluem recomendações para o isolamento social e fechamento de várias repartições públicas, inclusive abarcando órgãos do Poder Judiciário estadual, o qual editou uma norma própria, com a suspensão de várias atividades.

São essas as principais normas estaduais editadas: o Decreto nº 4.319 de 23 de março de 2.020, que estabeleceu o estado de emergência em todo o território estadual, e o Decreto nº 470 de 26 de março de 2020, do Município de Curitiba, que elencou os serviços essenciais, com recomendações para o setor privado.

No âmbito do Judiciário, o TJPR editou o Decreto de nº 161/2020, o qual dispõe sobre o segundo grau de jurisdição e determina a suspensão das sessões presenciais dos Colegiados do Tribunal de Justiça pelo prazo de 14 dias, com vigência a partir de 16 de março de 2020.

O referido decreto foi revogado por outro Decreto Judiciário do TJPR, de nº 172/2020 , que determinou que em decorrência da situação peculiar do Poder Judiciário do Estado do Paraná, no qual os processos judiciais e administrativos tramitam em sistema eletrônico digital (PROJUDI e SEI), admiti-se a ampla e irrestrita utilização do teletrabalho, ficando determinada a suspensão dos prazos processuais e administrativos no âmbito do Poder Judiciário paranaense no período de 19 de março a 30 de abril de 2020, com algumas ressalvas:

  1. a) retirada do feito do Plenário Virtual e os referentes a:
  2. b) movimentação na carreira da magistratura e aos de competência criminal e da infância e juventude, que envolvam réu preso, adolescente apreendido ou internado.

O mesmo ato ainda estabelece que os magistrados, apesar da suspensão dos prazos e da dispensa do trabalho presencial, devem manter suas atividades regulares.

A suspensão das atividades e o isolamento social impactaram drasticamente a economia, reduzindo o comércio no setor privado e consequentemente a rotatividade de capital no Estado, ocasionando uma diminuição no poder aquisitivo da população e da capacidade de quitação de contas.

Como uma forma de compensação para auxiliar as pequenas empresas, o governo federal prorrogou o pagamento do SIMPLES NACIONAL, assim como o Estado do Paraná que, através do Decreto nº 4.386/2020 – DOE PR de 27.03.2020, prorrogou o pagamento do ICMS dos meses de março, abril e maio do ano corrente.

Todas essas medidas e decretos do governo federal e estadual causam impactos diretos também no funcionamento do Poder Judiciário local, principalmente nas ações judiciais propostas e seus respectivos andamentos.

Se, de um lado o governo Estadual prorrogou os pagamentos de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), reduzindo na esfera da área de direito tributários o número de novas ações e a necessidade de decisões liminares a serem proferidas pelo Judiciário, de outro lado temos a recomendação do CNJ 62/2020, na área penal, a qual orienta a aplicação preferencial de medidas socioeducativas em meio aberto e a revisão das decisões que determinaram a internação provisória, notadamente em relação a adolescentes, e demais pessoas que consideradas em estado de risco.

Portanto, as determinações estabelecidas pelo CNJ podem implicar em pedidos por tutela judicial, notadamente se houver a evolução e aumento dos casos de COVID-19 no país e principalmente o aumento de número de óbitos no estado.

Estas premissas norteiam o trabalho de coleta de dados e análises, que foram efetuadas essencialmente na página da internet do Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) e na página da internet da  Secretaria de Estado da Saúde do Paraná (SESA-PR).

Foram coletados dados diretamente dos julgados, com o critério de busca e referência da palavra COVID. A coleta de dados foi efetuada em toda a base de decisões do TJPR, iniciando em março de 2020 até dia 17 de maio de 2020. Outra forma de coleta foi a amostral, para verificação de alterações nas decisões proferidas com a menção da palavra COVID e o aumento de casos confirmados e, ou, aumento de óbitos decorrentes do COVID-19. Importante ressaltar que nos gráficos apresentados neste artigo é utilizada a classificação processual estabelecida pelo CNJ, de classes, e assuntos, onde é feita a uniformização dos vários ramos do direito.[xvi]

A visualização dos dados através de gráficos permite uma análise comparativa e objetiva das leituras processuais, e com este objetivo apresentamos alguns resultados. O gráfico abaixo indica que, durante o mês de março de 2020, o TJPR teve um total de 75 decisões  (Monocráticas ou Acórdão), envolvendo a palavra COVID.

Quando observamos a classificação por tipo de processo e áreas, consta que  63 destes processos são da área de direito penal e direito processual penal, conforme se observa no gráfico abaixo:

Gráfico 1 –  Fonte: Elaborado com dados do TJPR, 2020

Já com os resultados apresentados a seguir, no gráfico 2, referente ao mês de abril, verifica-se que efetivamente houve um aumento nas decisões envolvendo a área de direito penal e processo penal, possivelmente objetivando atender às recentes determinações do CNJ. É importante destacar o aumento significativo de decisões, especialmente sobre Habeas Corpus, medida garantidora de direitos:

Gráfico 2 – Fonte: Elaborado com dados do TJPR, 2020.

O mês de maio, está ainda em andamento, mas através dos dados do gráfico 3, abaixo podemos perceber que a tendência de decisões, possivelmente dos pedidos de Habeas Corpus, está diminuindo, apesar das decisões judiciais continuarem concentradas na área penal, conforme:

Gráfico 3 – Fonte: Elaborado com dados do TJPR, 2020.

A presente análise jurimétrica também considerou os dados de decisões gerais, ou seja, sem a utilização da palavra COVID como filtro. De forma geral, é possível verificar que no mês de março só houve suspensão de prazos a partir do dia 18, acarretando um aumento expressivo na quantidade de decisões, conforme demonstra o gráfico 4 abaixo:

Gráfico 4 –  Fonte: Elaborado com dados do TJPR, 2020.

Já os dados do mês de abril, os quais foram coletados, tratados e demonstrados no gráfico 5 abaixo, indicam a tendência de redução do número de decisões no mês de abril, o qual foi o primeiro mês integral de teletrabalho e de suspensão de prazos judiciais, conforme:

Gráfico 5 –  Fonte: Elaborado com dados do TJPR, 2020.

As decisões judiciais proferidas nos dois últimos meses refletem a evolução dos casos de COVID-19 no estado do Paraná, fato este que é corroborado a partir do confronto dos dados fornecidos pela SESA-PR, com os casos confirmados de COVID-19 e os de óbitos. Através desse confronto de dados, é possível identificar que há curva ascendente (Gráfico 6) nos casos de óbito, os quais são expressivos, mas não chegam a acompanhar a curva exponencial dos casos confirmados:

Gráfico 6 – Fonte: Elaborado com dados da SESA-PR.

            Outra questão que foi levantada e analisada é, se existe uma correlação entre o total de casos coletados no período de março a maio de 2020 (aqui chamamos de vetor “N”), com os casos coletados no mesmo período com o filtro da palavra COVID (este vetor chamamos de “n”).

Já o critério de coleta amostral das decisões judiciais utilizado foi: verificação das decisões proferidas às segundas-feiras: iniciando com os dados do dia 16/03/2020 (que é a primeira segunda feira anterior a suspensão dos prazos judiciais), e indo até o dia 04/05/2020, que é a primeira segunda feira após o término da suspensão de prazos. Coleta amostral idêntica, no que se refere às datas, foi feita na página da SESA-PR, com amostragem dos casos confirmados e casos de óbitos, conforme gráfico 7:

Gráfico 7 – Fonte: Elaborado com dados da SESA-PR e TJPR, 2020.

Os dados coletados jurimetricamente indicam que, existe uma constância no volume de decisões gerais. Já nas decisões da área criminal-penal é possível perceber um aumento de quantidade de ações. Outro dado relevante é a proporcionalidade entre o total de ações com a palavra COVID-19 e a totalidade de ações crime-penal com a palavra COVID-19, o que confirma a tendência de que a maioria das ações envolvem a área penal.

E, cabe ressaltar que  evolução das decisões da área crime-penal que tem menção da palavra COVID-19 aumenta em proporção, ainda não tão acentuada, em correlação com os  casos de Óbitos de COVID-19 (gráfico 8).

Gráfico 8 – Fonte: Elaborado com dados da SESA-PR e TJPR, 2020.

Portanto, os dados aqui apresentados, os quais foram coletados através do método jurimétrico indicam que, as decisões do Poder Judiciário do Estado do Paraná tendem a acompanhar quantitativamente o aumento dos casos de COVID-19, pela necessidade de prestação jurisdicional à população, assim como a evolução dos casos de óbito e de ações no âmbito penal. Fato este que poderá ser utilizado para confirmar a necessidade de se aumentar o isolamento social no Estado.

CONCLUSÃO

Analisados jurimetricamente os dados, podemos concluir pela possibilidade de identificar e quantificar o impacto da decretação do estado de calamidade por conta da pandemia da COVID-19 no Poder Judiciário do Estado do Paraná dentro do recorte temporal estabelecido.

A área de maior impacto foi, sem sombra de dúvida, a criminal, justamente por tratar de pessoas em confinamento coletivo, e, portanto, com alto risco de contaminação. O gráfico “1” ilustra bem o resultado apontando um pico de 553 casos somente de Habeas Corpus, contra 63 da área de direito penal, no mês anterior.

Da mesma forma que demonstra com a evolução dos casos de COVID no mês de maio e a verificação de que, os casos de óbitos não acompanham a curva exponencial dos casos confirmados ocorre uma redução nas decisões com menção a palavra COVID.

Outro dado que é possível observar é a produtividade dos magistrados, que demonstrou uma queda acentuada no momento imediatamente posterior à decretação do teletrabalho. A suspensão dos prazos não impediu o prosseguimento dos processos, porém, reflete um atraso compreensível no andamento processual.

Observa-se que, com a realização do trabalho remoto por parte dos magistrados e servidores, foi demonstrada a possibilidade do andamento processual no ambiente virtual, o qual pode ocasionalmente sofrer com a oscilação da conexão da internet e disponibilidade de um número maior de servidores capazes de atender as demandas por meio de aparelhos eletrônicos e digitais.  O período de adaptação das rotinas profissionais e pessoais destaca-se também como variável explicativa desta compreensível redução na produtividade.

Dentro do período coletado, os dados indicam que existe uma constância no volume de decisões judiciais no geral. Já nas decisões da área criminal-penal é possível perceber um aumento de quantidade de ações. Outro dado relevante é a proporcionalidade entre o total de ações com a palavra COVID-19 e a totalidade de ações crime-penal com a palavra COVID-19, o que confirma a tendência de que a maioria das ações envolvem a área penal. E percebe-se que há uma evolução das decisões da área crime-penal que tem menção da palavra COVID-19 (ainda não tão acentuada) com os casos de Óbitos de COVID-19.

É impossível a esta altura desenhar o mapa completo do impacto nos processos provocado pela decretação do estado de calamidade no Poder Judiciário paranaense. Justamente pela dificuldade inerente em se analisar qualquer fenômeno social ainda em andamento. Mal comparando, seria como se em 1944, o cientista tentasse desvendar os impactos econômico-sociais provocados pela II Guerra Mundial. Inobstante, é possível identificar alterações quantitativas no que se refere ao protocolo de novos casos, redução de produtividade, edição de decretos e etc.

Os dados aqui analisados podem servir, para além da construção de uma futura agenda de pesquisa, para aprimoramento das recomendações e medidas em tempos de pandemia, bem como para orientar a tomada de decisões dos gestores e dos policy makers do poder judiciário, bem como dos jurisdicionados e operadores do direito.

 REFERÊNCIAS

 BALDWIN, J. & DAVIS, G. (2005). Pesquisa empírica em direito. Manuais de Oxford Online. doi: 10.1093 / oxfordhb / 9780199248179.013.0039

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Qui, 09 Abr 2020.”

https://s3.amazonaws.com/academia.edu.documents/62988837/Direito___Ciencia_de_Dados_tendencias_e_desafios.pdf?response-content-disposition=inline%3B%20filename%3DDireito_and_Ciencia_de_Dados_tendencias.pdf  – “DIREITO & CIÊNCIA DE DADOS: TENDÊNCIAS E IMPACTOS DA QUARTA REVOLUÇÃO INDUSTRIAL.”

[i] Pesquisador do grupo de pesquisa TecnoLawgia – Direito e Inovação vinculado à FAE Centro Universitário São José dos Pinhais, Professor de Processo Civil, Empreendedorismo e Inovação Jurídica,pós graduado em Processo Civil pela PUC/PR em 2008, Mestre em Ciência Política pela Universidade Federal do Paraná, Doutorando em Ciência Política e Eficiência Judicial pela UFPR. Advogado e Consultor. E-mail: <fernandoschumak@hotmail.com>

[ii] Pesquisadora do Núcleo de Estudos Avançados em Direito Internacional e Sustentabilidade (NEADI) da PUC/PR – Curitiba. Graduada em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná – Curitiba – Paraná. Advogada OAB/PR. E-mail: <isa-calazans@hotmail.com>

[iii] Pós graduada em Direito Tributário pela UNICURITIBA e pelo IBET, Mestre em Políticas Públicas pela Universidade Federal do Paraná, Doutoranda em Políticas Públicas pela UFPR. Auditora  e Consultora. E-mail: <magnaknopik@gmail.com>

[iv] ABJ, Associação Brasileira de Jurimetria. O que é Jurimetria (2018). Disponível em: < https://abj.org.br/o-que-e-jurimetria >. Acesso em 14/05/2020.

[v] A análise volumétrica, de modo equivalente ao que se faz na Química, consiste em saber o número de processos de determinada pessoa ou empresa, qual a sua causa raiz, os pedidos principais e subsidiários, os valores envolvidos, dentre outras informações. https://www.thomsonreuters.com.br/content/dam/openweb/documents/pdf/Brazil/white-paper/As_7_Tend%C3%AAncias_para_o_uso_da_Inteligencia_Artificial_EM_2018.pdf

[vi]https://e-justice.europa.eu/content_impact_of_the_covid19_virus_on_the_justice_field-37147-en.do

[vii] https://www.clydeco.com/insight/article/covid-19-impact-on-courts-and-arbitration

[viii] DIÁRIO OFICIAL DA UNIÃO. Portaria nº 188/2020 de 03 de fevereiro de 2020. Ministério da Saúde – Disponível em: < http://www.in.gov.br/en/web/dou/-/portaria-n-188-de-3-de-fevereiro-de-2020-241408388 > . Acesso em 21 de maio de 2020.

[ix] ZABALA, Filipe Jaeger; SILVEIRA, Fabiano Feijó. Jurimetria: estatística aplicada ao direito. Revista Direito e Liberdade, v. 16, n. 1, p. 87-103, 2014.

[x] ABJ, Associação Brasileira de Jurimetria. O que é Jurimetria (2018). Disponível em: < https://abj.org.br/o-que-e-jurimetria >. Acesso em 14/05/2020.

[xi] ABJ, Associação Brasileira de Jurimetria. O que é Jurimetria (2018). Disponível em: < https://abj.org.br/o-que-e-jurimetria >. Acesso em 14/05/2020.

[xii] ABJ, Associação Brasileira de Jurimetria. Institucional (2018). Disponível em: < https://abj.org.br/institucional/ >. Acesso em 14/05/2020.

[xiii] Loevinger, Lee. “Jurimetrics–The Next Step Forward.” Minn. L. Rev. 33 (1948): 455. e Loevinger, Lee. “Jurimetrics: Science and prediction in the field of law.” Minn. L. Rev. 46 (1961): 255.

[xiv] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/emendas/emc/emc45.htm

[xv] https://www.cnj.jus.br/pesquisas-judiciarias/justica-em-numeros/

[xvi]  Resolução-CNJ n. 12, de 14 de fevereiro de 2006. e Resolução-CNJ n. 46, de 18 de dezembro de 2007.

 

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